Por 15 a 8, apesar da forte pressão de pescadores, o segundo substitutivo do Projeto de Lei
chamado de “Transporte Zero” foi aprovado em 2ª votação na Assembleia nesta quarta (28).
O PL 1363/2023 altera a política de pesca em Mato Grosso, proibindo o transporte, armazenamento e comercialização de peixes dos rios do Estado por cinco anos – com trava de 3 anos para reanálise.
A votação foi simbólica, mas não secreta. A proposta de votação nominal, feita pelo petista Lúdio Cabral, não foi acatada.
O texto prevê que durante cinco anos será permitida somente a pesca na modalidade “pesque e solte” e as capturas de peixes às margens do rio destinados ao consumo no local ou de subsistência.
O projeto vem causando polêmica desde o início da discussão. Ele foi aprovado em 1ª votação no dia 2 de junho e, desde então, vem passando por discussões, audiências públicas e revisões do texto integral.
Antes da votação, parlamentares Comissão de Constituição e Justiça apresentaram o relatório em plenário, que rejeitou 14 emendas e emitiu parecer favorável ao substitutivo integral apresentado por lideranças.
Entre as novidades do texto substitutivo está a previsão de que a proibição precisa ser revista daqui a 3 anos e que indígenas e quilombolas fiquem de fora das imposições.
Declaram ser contrários à proposta os petistas Lúdio Cabral e Valdir Barranco; doutor João e Thiago Silva, do MDB; Elizeu Nascimento (PL), Wilson Santos (PSD), Sebastião Rezende (UB) e Faissal Calil (Cidadania). Apesar de também ser contrário ao projeto, o presidente Eduardo Botelho (UB) não vota.

“Esse projeto é cruel. Se ele for aprovado nós faremos uma luta judicial contra ele”, disparou Barranco. Depois, já na votação afirmou: “É conversa de boteco, de bar, de beira de campo querer dizer que os pescadores estão acabando com os peixes do rio porque a ciência diz o contrário”.
“Esse projeto não tem conserto, tem que ser rejeitado sumariamente”, emendou Lúdio, que promete buscar outras instâncias para reverter a proposta.
Já Thiago Silva ressaltou estar junto com os pescadores e lembrou que a profissão é bíblica.

Declaradamente favorável ao texto, Diego Guimarães (Republicanos) reconheceu problemas ambientais provocados pelo agronegócio e depois alfinetou: “Eu pergunto onde os senhores estavam quando o problema de saneamento não foi resolvido aqui na Baixada Cuiabana, inclusive com defensores que era prefeitos da Capital e não resolveram o problema do saneamento”, disse sem citar nomes. Mas a declaração foi vista como indireta a um dos defensores dos pescadores, Wilson Santos (PSD), que foi prefeito da Capital.
Gilberto Cattani (PL) diz que participou das audiências e que concorda com os dois lados. “Hoje entrei dizendo que ia me abster, mas conforme foi andando, vi que a gente precisa se posicionar”, iniciou. Disse que definiu o seu voto a favor da proposta após ouvir os colegas petistas, que citaram o presidente Lula e são contrários à proposta.
Defensor ferrenho dos pescadores, Wilson fez questão de exibir um vídeo com depoimentos de pescadores que se dizem revoltados com a proposta do Transporte Zero. “Tenho 34 anos como pescador, como vou mudar de profissão agora”, disse um deles.
Da tribuna, Wilson disse que nunca viu o Executivo mandar um projeto tão mal feito como esse.
“O Governo mandou há 4 anos (o Cota Zero), ele retirou. Teve 4 anos e manda um projeto sem estudo técnico nenhum. Uma vergonha votar um projeto sem estudo técnico nenhum”, disparou. Depois, afirmou que os pescadores sempre foram esquecidos e que, desde 2012, há um projeto para encher as bacias com hidrelétricas. Por fim, citou trechos da bíblia. Entre eles Isaías, capítulo 10, versículo 1. “Ai dos que decretam leis injustas e dos escrivães que escrevem perversidades, 2 para prejudicarem os pobres em juízo, e para arrebatarem o direito dos aflitos do meu povo, e para despojarem as viúvas, e para roubarem os órfãos!”. E encerrou com Provérbios: “Quem semeia a justiça colhe segura recompensa. O ímpio recebe um salário ilusório; mas o que semeia justiça recebe galardão seguro.”
Por fim, Wilson respondeu a Diego, lembrando que os pais dos colega foram seus assessores na Prefeitura e o ajudaram muito. Depois, lembrou que iniciou o processo de concessão do saneamento, o que resolveu a situação.

Um dos defensores do PL, Carlos Avalone (PSDB) reconhece que a proposta chegou com muitos problemas, mas assegura que houve melhorias. Ele ressalta, por exemplo, a inclusão da trava de 3 anos. Sob vaias, ele ressaltou que a questão da Previdência foi avaliada e que os pescadores terão direito à aposentadoria. “Estamos agregando ações de apoios às colônias, mas vocês saberão em outro momento”. Segundo ele, a Empaer, por exemplo, vai auxiliar os profissionais.
Líder do governo na Assembleia, Dilmar Dal Bosco (UB) garante que houve intenso debate sobre a proposta. Segundo ele, cada deputado apresentou suas alegações e ajustes foram feitos. O líder ainda pediu para que a base votasse a favor para melhorar a pesca. Botelho, por sua vez, reconheceu que tema causou discussões internas, mas que tudo isso faz parte do trabalho.
Mobilização
Dezenas de pescadores, contrários à proposta, lotaram as galerias da Assembleia, onde também estavam manifestantes a favor da proposta do Executivo. Contrários ao PL, chegaram ao Parlamento marchando sob gritos: “Governador vou avisar, o Cota Zero não vai passar”.
Projeto
O Governo estadual defende o projeto sob a justificativa de que há escassez de peixes nos rios de Mato Grosso e que, por meio desta lei, há a possibilidade repovoamento, além de pontuar que o turismo pesqueiro através do “pesque e solte”, gerará mais renda e promoverá o Estado.

Pesquisadores da UFMT e o próprio Ministério da Pesca e Aquicultura emitiram Notas Técnicas se manifestando contra a proposta, afirmando que a mudança prejudica os pescadores profissionais, que dependem da atividade para viver, prejudica o comércio que envolve a pesca, como lojas de iscas e de artigos de pesca, além de tablados e meios de hospedagens. Os pescadores difusos também serão impactados. A lei federal da Pesca também estaria sendo ferida pelo texto.
Segundo as entidades, a aprovação da lei pode trazer insegurança alimentar, desestruturação das comunidades ribeirinha e desigualdades sociais, além de destruir parte de uma herança cultural que tem a pesca como modo de subsistência.
Auxílio aos pescadores
Uma das polêmicas era quanto ao auxílio financeiro que seria destinado aos pescadores que dependem da atividade para sua subsistência. Inicialmente, a proposta do Governo era de apenas R$ 1.320 no primeiro ano, R$ 660 no segundo ano e R$ 330 no terceiro.
No entanto, parlamentares pontuaram que a proposta seria descabida e definiram, em
substitutivo, o valor de um salário mínimo a ser pago mensalmente pelo prazo de três anos, visando dar suporte aos pescadores.
Conforme o novo texto, o auxílio será devidamente pago somente aos pescadores profissionais artesanais inscritos no Registro Estadual de Pescadores Profissionais (REPESCA), que comprovarem residência fixa em Mato Grosso e que faziam pesca artesanal, bem como mediante comprovação de profissão exclusiva e meio de vida principal, de forma ininterrupta, como pescador, sem contar com outra fonte de renda.
O valor não deverá ser pago durante o período de defeso, considerando que serão atendidos pelo seguro-desemprego. O Estado terá o prazo de 60 dias para regularizar o cadastro de pescadores.
Instalação de PCHs (Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs)
Conforme trecho do substitutivo integral, fica proibida a realização de estudos e relatórios para a implementação das PCHs. Além disso, veda a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema) de analisar possíveis pedidos de Licença Ambiental para a construção deste tipo de empreendimento, durante este período.
Via: RD News